48º Congresso da
UNE
(União Nacional dos Estudantes)
19
a 22 de junho de 2003
Goiânia - GO
A visão de uma estudante de Moda da FURB
Massa
politicamente deficiente, manipulada pela UJS (União da Juventude Socialista),
pelo PC do B (Partido Comunista do Brasil) e pela atual gestão da UNE, que coincidentemente
tinha a melhor estrutura para divulgação de sua tese[1]. A massa, inclusive eu, era animada pelos
chamados chefes de delegação[2],
que mais pareciam aqueles animadores de auditório de programas dominicais.
Em oposição – ou esquerda - estavam partidos como PSTU (Partido
Socialista dos Trabalhadores Unificado), PCO (Partido da Causa Operária), PT
(Partido dos Trabalhadores) em suas mais diversas facções, PFL (Partido da
Frente Liberal), PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro), PSDB (Partido
da Social Democracia Brasileira), PDT (Partido Democrático Trabalhista), entre
outros.
Goiânia - GO
Curioso, não?
Ao contrário do que eu, na minha ignorância político partidária, sempre
pensei, o PC do B ali era a direita.
Tudo muito estranho...
Entre esquerdas e direitas, eu estava no meio
de um debate visivelmente – e por que não, quase exclusivamente – político
partidário, onde garrafas de água voavam; onde pessoas, que segundo meu chefe
(democracia estranha essa, né?), compunham a UNE, se amontoavam em filas quilométricas
por um prato de feijão com arroz ou um pãozinho diminuto e onde havia muita
cerveja (cara!), maconha e imaturidade pessoal e política. Isso tudo depois de pagar uma inscrição
considerável[3].
A "desorganização" do Congresso
estava uma beleza! Alojamentos precários
(eu fiquei num colégio super simpático e sujo, tomando banho gelado num
chuveiro que ficava exatamente em cima de uma privada onde geralmente tinha um
cocô boiando), segurança impecável (roubaram várias mochilas no alojamento e a
revista na entrada das plenárias[4]
era inexistente até alguém ter a cabeça quase quebrada por um objeto voador não
identificado), alimentação ágil e planejada (a comida era boa, apesar do
cardápio quase nada variado, mas depois de uma fila de duas horas embaixo de
sol, o que não se torna gostoso, né?) e programação cultural intensa (dois
grandes shows – Alceu Valença e Mestre Ambrósio – que eu não vi porque minha
distinta delegação chegou atrasada; clipes estrangeiros nos intervalos de quase
10 horas entre o café da manhã – o pãozinho diminuto, lembra? – e alguma coisa
acontecer; e um tal de CUCA, que de Cultura e Arte tinha muito pouco).
O maior Congresso da história da UNE,
conforme repetido exaustivamente, vai marcar minha história com tristeza,
perplexidade e preocupação com o futuro da entidade e da política
brasileira. O esforço das pessoas que
"me levaram" ao 48º Congresso da UNE se resumem a uma boa retórica e
justificativas vazias para um socialismo que Deus queira um dia deixe de ser
utópico e traga à humanidade uma verdade construída com justiça e sabedoria.
DIÁRIO DE BORDO
Dia 17 de junho – Terça-feira
Eu estava com toda bagagem pronta, porque conforme meu
chefe de delegação havia dito, sairíamos de Blumenau em direção à Goiás, à meia
noite. Pois é... Alguém me informou pelo
celular que a viagem havia sido cancelada porque descobriram que o ônibus era
muito podre. Menos mal, né? Mas alguma coisa não bateu bem. Não sei porquê senti uma tremenda vontade de
desistir, mas pôxa, eu fui eleita e isso não era justo com os estudantes do meu
Curso. Mais 24 horas de espera não
fariam tanta diferença, acreditei eu.
Dia 18 de junho – Quarta-feira
Após 1 hora e meia de atraso debaixo do ponto de
ônibus com muita chuva ao redor, embarquei no ônibus leito de quarenta lugares,
padrão classe A, já na madrugada de quinta-feira. Apesar da falha na pontualidade – o que me
irrita muito! – com um ônibus desse, reclamar do quê? Após breves
esclarecimentos e apresentações, a delegação com pessoas da UNIVALI, FEBE e
FURB dormiu tranqüilamente.
Dia 19 de junho – Quinta-feira
Dia de viagem.
Nas paradas, comidas exorbitantemente caras e um pouco de nicotina pra
relaxar da tensão do eterno sentar-se. A
delegação está mais entrosada, mas o papo gira em torno da expectativa para o
Congresso e assuntos como a diferença de um radical e um moderado, quem foi
Trotski, entre outras questões do gênero.
Vídeos repetindo-se nos três aparelhos de televisão do ônibus e alguns
copos suspeitos percorrendo seu corredor.
Dormir é o jeito!
Dia 20 de junho – Sexta-feira
Chegamos.
Goiânia me recebeu com olhares desconfiados, ruas sujas e uma
temperatura super baixa, que aumentou entre o tempo que chegamos ao alojamento
e o que ficamos esperando desocuparem algum quarto/sala de aula do Colégio
Estadual Pré Universitário, que segundo nosso "chefe", estava
reservado somente para as pessoas – em alguns momentos observadores e suplentes
até foram considerados pessoas! – vindas de Santa Catarina.
Até a hora do almoço aconteciam
palestras sobre assuntos referentes à Universidade em local para mim
incógnito. Tudo bem... Tava todo mundo
com sono mesmo!
Depois do almoço no R.U.
(Restaurante Universitário) no Centro Universitário da UFG (Universidade
Federal de Goiás), estavam acontecendo discussões muito interessantes sobre as
propostas que seriam levadas às plenárias no dia seguinte. As propostas que iríamos votar neste dia à
noite, já haviam sido discutidas.
Haviam muitos carros de som com
militantes de vários partidos berrando – literalmente! – palavras de chamado
para discussões macro (a UNE adora isso!) e de questões específicas de algumas
áreas. Ai, que dúvida cruel! Para onde ir agora??? Tudo bem... Tava todo mundo com sono mesmo!
Após uma soneca então, fomos
encaminhados em mutirão – ou seria arrastão? – para o Estádio Serra Dourada,
onde ficamos esperando - mais exatamente sentados no chão da quadra do ginásio,
ao lado do estádio – começar a votação das propostas. Em pauta: cenário nacional e internacional e
a posição da UNE frente às questões.
Lindo! Se a votação não tivesse
atrasado umas três horas. Mal sabia o
que aconteceria no dia e na noite seguinte...
Votei junto com o curral, mas
nem me dei conta disso. Santa
inocência! Em algumas horas até me senti
realmente feliz de estar ali participando de um momento tão importante para a
história da UNE e do Brasil, mas tudo não passou de uma empolgação de
principiante.
Dia 21 de
junho – Sábado
Acordei super bem humorada no sábado porque afinal,
depois de um belo discurso do "chefe" sobre a importância da UNE e
como foi crucial sua participação na história brasileira, iríamos para o
ginásio hoje discutir questões ligadas diretamente a minha realidade, políticas
de Universidades públicas e privadas.
Fiquei entre espera na quadra
do ginásio, espera na fila pra comer, comendo, e novamente sentada na quadra,
exatamente oito horas. Ah, eu fiz xixi
de vez em quando porque afinal de contas tomei algumas garrafinhas de água de
R$ 2,00 durante todo esse tempo!
A discussão finalmente iria
começar!
-
Povo, sobe lá pra
arquibancada mais alta do ginásio!
-
Povo, desce! Desculpa...
Sinceramente, não há maturidade
política que resista! Por pouco não
mandei o "chefe" pr´aquele lugar que vocês sabem... Voltei com outros dois conscientes membros da
minha delegação, a pé, para o alojamento onde tomei banho na água gelada que
caía do chuveiro na privada, dessa vez sem cocô. Ufa!
Fui, finalmente, dar uma
voltinha na praça central do Centro Universitário onde acontecia uma grande
movimentação – basicamente capitalista – com muitas barracas e comidas gostosas
como a tapioca que experimentei pelas mãos de um dos "chefes" (afinal
eles não eram de todo mal). Essa mesma
movimentação (vendia-se de camiseta do Che Guevara e livro – do Trotski! – a
cachaça da Paraíba ) podia ser vista nas imediações do Estádio. Pelo menos a gente podia passar o tempo
olhando (porque comprar era meio difícil, né?) as bugigangas ou lendo umas teses
alheias à que a minha delegação defendia.
Na volta para o alojamento,
cama. E dormi até ouvir uma seqüência de três estouros e entrar uma menina
chorando compulsivamente no quarto / sala de aula dizendo que tinha visto o
revólver, que o cara ia entrar ali pra matá-la, que a gente ia se ferrar,
enfim, praticamente uma cena do cinema novo brasileiro retratando a violência
contemporânea. Eu, obviamente, não
preguei o olho a noite toda, né? No dia
seguinte descobri que os estouros eram na realidade três bombinhas vindas de um
tal de "Arraial do Cerrado", freqüentado por muitos dos meus
companheiros de delegação. Tudo não passou de um susto, que poderia ser
evitado por segurança mais efetiva.
Dia 22 de
junho – Domingo
Ao acordar eu só conseguia
pensar que logo, logo eu estaria em casa, no sossego do meu lar...
Acordei e tomei café (R$ 3,80
por um pão de queijo, um misto quente, uma média e um suco de laranja) no
colégio em frente ao nosso e descobri que realmente a desorganização não era
total e que eu realmente fui extremamente azarada em ser catarinense nesse
momento. Mineiros e paulistas tinham à
sua disposição uma estrutura muito com boa com banheiros de mármore, sabonete
na pia (!) e papel higiênico (!!!!!!!).
Tudo bem... Prefiro passar um
aperto alguns dias e ter orgulho de ser catarina durante todo o ano.
Chegamos no ginásio – a esta
altura eu já estava íntima desse caminho – e antes de sair do ônibus (umas
9h30min da manhã) combinamos que após a votação, prevista para as 11h a
delegação se encontraria no ônibus e tomaria o caminho da roça, ou melhor, de
SC. Fiquei até às 14h30min sentada no
ginásio (que novidade!!!!), comi um sanduíche natural e uma coca-cola (só pra
confrontar a oposição, que neste momento era qualquer pessoa filiada a qualquer
partido político!) e fui pro ônibus ler o Pasquim 21. Que maravilha! Sossego...
Até que apareceu o "chefe", às 16h30min, me convidando para
assistir a plenária final, na qual seria eleita a nova chapa da UNE, apesar de
eu já ter pronunciado a minha abstenção na referida votação.
Voltei a sentar-me na quadra do
ginásio, carregando meu travesseiro dessa vez.
Às 19h, começaram as apresentações das nove chapas. Cada uma tinha 5 minutos para a defesa e a cada
discurso uma série de – Conclua, companheiro!, eram pronunciados.
Voltei pro ônibus. Às 22h30min chegaram os últimos perdidos e
após muita discussão e pingos nos "is" o motor foi ligado e
finalmente começava a viagem de retorno à Blumenau.
Dia 23 de
junho – Segunda-feira
Acordei 6h da manhã em Uberaba,
MG e fui direto para o banheiro tirar um pouco da craca de Goiânia (a cidade
era extremamente poeirenta) que ainda restava em meu corpo. Com a toalha ainda na cabeça, olhei o
"chefe" dizendo que o motorista estava saindo e se eu não corresse ia
perder o ônibus. Putz! Sentiu, né?
Correria total.
Foi assim mais ou menos o resto
do dia, com alguns acordos e muitos desacordos, que passamos dentro do
ônibus. Quase fui eleita a mais chata e
mais mala do ônibus, numa votação (ai, de novo!) com intuito de divertir a
galera. Tudo bem. Sou mala, mas não sou pau mandado! Ou será que fui considerada mala justamente
por não concordar com tudo que me falaram??
Às 22h30min avistei a placa da
Hacco Etiquetas e mêu, que felicidade!
Minha cidade, minha casa, minha
cama, minha realidade (que até pode ser considerada medíocre por alguns,
mas...) que eu adoro!!!!!!
[1]
Estrutura de propostas para o próximo período de gestão da UNE, caso a chapa
ligada à tese seja eleita no Congresso, além de diretrizes para as votações que
ocorreram no 48º CONUNE.
[2]
Chefes de delegação são os responsáveis pela coordenação de eleição ou
indicação dos delegados (com poder deliberativo / de voto) de cada Curso de
Graduação nas Universidades. São as
pessoas que agilizam os trâmites da viagem e se responsabilizam pela delegação
(conjunto de estudantes de uma mesma Instituição, de um mesmo ônibus ou de um
mesmo estado).
[3]
Delegados pagaram R$ 30,00 e Observadores e Suplentes R$ 60,00. Atentem que só delegados tinham mais de
6.000!
[4]
Reunião de todos os participantes do Congresso para deliberação de propostas
discutidas anteriormente e eleição da chapa gestora da UNE nos próximos 2 anos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário